sexta-feira, 4 de maio de 2012

A minha gaivota






"O jardim tem aquele cheiro a relva que nos seduz e nos lembra os jogos de bola e os namoros de adolescência. Encontrei-a sentada no banco de madeira, iluminada pelo tremeluzir de luzes que vinham dos altos - raios de sol que se esgueiravam pelo entrelaçado das copas das árvores. Lia o livro. Sentei-me a seu lado com um sorriso. Será que está mesmo a ler, perguntei-me. Como que em jeito de resposta, ela apontou para uma das páginas e passou os dedos por uma frase: «…uma gaivota é uma ideia ilimitada de liberdade». Será que ela já entende os conceitos de liberdade? - «… e todo o vosso corpo, desde a ponta de uma asa até à outra, não é mais que o vosso próprio pensamento», sublinhou com o dedo. Creio que entende. A sua parte racional recomeça a funcionar, resta-lhe agora resgatar as emoções. Esta certeza fez assomar uma lágrima no canto dos meus olhos, dei-lhe um beijo na testa e sussurrei para ela:
-És a minha Gaivota!

  ... Ela olhou para mim, limpou-me a lágrima com a ponta dos dedos, mas manteve o rosto sereno, sem expressar emoções. -Agora és a minha Gaivota! Vais aprender a voar de novo!», repeti, e dei-lhe a minha maçã." ...

João Morgado
Excerto de Diário dos Imperfeitos

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